CBD aprovado para epilepsias raras: indicações, dose e segurança

CBD aprovado para epilepsias raras: indicações, dose e segurança

A jornada para o alívio de epilepsias refratárias, como as síndromes de Dravet e Lennox-Gastaut, é frequentemente marcada por desafios significativos, onde as terapias convencionais nem sempre oferecem controle adequado. A aprovação do canabidiol (CBD) para estas condições raras representou um marco importante na medicina, trazendo uma nova esperança e uma alternativa terapêutica fundamentada em evidências robustas. Este artigo explora as indicações, mecanismos de ação, e, crucialmente, os aspectos de segurança e dosagem que cercam o uso do CBD no tratamento dessas epilepsias severas.

Como o CBD teoricamente atua

  • Modular a atividade de canais iônicos, como os canais de cálcio e sódio, que estão envolvidos na excitabilidade neuronal.
  • Interagir com receptores serotoninérgicos (especialmente 5-HT1A), que desempenham um papel na regulação da ansiedade e humor, mas também na modulação de crises epilépticas.
  • Atuar em receptores vaniloides (TRPV1), que estão implicados na percepção da dor e na inflamação.
  • Inibir a recaptação de anandamida, um endocanabinoide, elevando seus níveis no cérebro e prolongando seus efeitos anticonvulsivantes.
  • Reduzir a neuroinflamação e exercer efeitos neuroprotetores, fatores que podem contribuir para a progressão e severidade de certas epilepsias.

O que está COMPROVADO

A evidência mais robusta para o uso do CBD em epilepsia deriva de ensaios clínicos controlados e randomizados, que levaram à aprovação regulatória em diversos países. A Food and Drug Administration (FDA) dos EUA e a European Medicines Agency (EMA) aprovaram uma formulação específica de CBD de grau farmacêutico (Epidiolex®/Epidyolex®) para o tratamento de crises associadas a três síndromes epilépticas raras e graves: Síndrome de Lennox-Gastaut (SLG), Síndrome de Dravet e Esclerose Tuberosa (ET). Estudos clínicos de fase 3 demonstraram que o CBD reduziu significativamente a frequência das crises. No Brasil, a Anvisa, por meio da RDC 327/2019, regulamentou a fabricação, importação e comercialização de produtos à base de cannabis para fins medicinais, permitindo a venda de produtos de canabidiol mediante prescrição médica, incluindo os de alto padrão para as condições mencionadas, com comprovação de segurança e eficácia por meio de ensaios clínicos.

O que está EM ESTUDO

  • Estudos estão em andamento para avaliar a eficácia do CBD em outras formas de epilepsia refratária, como a síndrome de Doose (epilepsia mioclônica atônica), a síndrome de West (espasmos infantis) e epilepsias de início tardio.
  • A pesquisa também se concentra em entender melhor as interações do CBD com outros medicamentos anticonvulsivantes e explorar a possibilidade de seu uso como monoterapia ou em combinação com outras substâncias canabinoides.
  • Há um esforço para identificar biomarcadores que possam prever a resposta individual ao tratamento com CBD, permitindo uma abordagem mais personalizada.
  • As limitações atuais incluem a necessidade de mais estudos de longo prazo para avaliar a segurança e eficácia do CBD, e a otimização das formulações e vias de administração.

Segurança e interações

Efeitos adversos

  • Sonolência
  • Sedação
  • Diminuição do apetite
  • Diarreia
  • Fadiga
  • Elevação das enzimas hepáticas (ALT e AST)

Monitorização hepática

A elevação das transaminases hepáticas (ALT e AST) é um efeito adverso conhecido do CBD, especialmente quando utilizado em doses mais altas ou em combinação com outros medicamentos que podem afetar o fígado, como o valproato. Por isso, a monitorização regular da função hepática, por meio de exames de sangue, é crucial antes do início e durante o tratamento com CBD. Em caso de elevações significativas, pode ser necessária a redução da dose ou a interrupção do tratamento, sempre sob orientação médica.

Interações medicamentosas

O CBD é metabolizado no fígado por um sistema de enzimas chamado citocromo P450 (CYP450) e pode alterar a forma como outros medicamentos são processados. Interações particularmente relevantes ocorrem com anticonvulsivantes (clobazam, valproato, topiramato e zonisamida), anticoagulantes (varfarina) e outros fármacos metabolizados pelo CYP450. É imprescindível que o médico esteja ciente de todos os medicamentos que o paciente está utilizando.

Populações especiais

  • Crianças: A segurança e eficácia foram bem estabelecidas nos ensaios clínicos, mas a dosagem deve ser ajustada individualmente.
  • Gestantes e lactantes: Não há dados suficientes sobre a segurança. O uso não é recomendado, a menos que os benefícios potenciais superem os riscos, sob estrita supervisão médica.
  • Idosos: Exige cautela devido à maior sensibilidade a efeitos adversos e à polifarmácia, aumentando o risco de interações medicamentosas.

Uso prático e qualidade do produto

  • CBD Isolado: Contém 99% ou mais de canabidiol puro, sem outros canabinoides, terpenos ou flavonoides. É a forma que foi aprovada em formulação farmacêutica para epilepsias raras.
  • CBD Broad Spectrum (Amplo Espectro): Contém CBD e outros canabinoides, terpenos e flavonoides, com o THC removido ou em níveis indetectáveis.
  • CBD Full Spectrum (Espectro Completo): Contém CBD, todos os outros canabinoides (incluindo THC, dentro dos limites legais), terpenos e flavonoides da planta.

Regulação no Brasil

No Brasil, a RDC 327/2019 da Anvisa estabelece os requisitos para a concessão da autorização sanitária de produtos de Cannabis para uso medicinal. A RDC 660/2022 simplificou as regras para a importação por pessoa física. A obtenção de produtos por vias regulamentadas pela Anvisa garante qualidade e conformidade. É essencial a prescrição de um médico habilitado.

Perguntas frequentes

O CBD pode curar a epilepsia?

Não. O CBD é um tratamento adjuvante que visa reduzir a frequência e a intensidade das crises, mas não oferece a cura da doença.

Qual a dose inicial recomendada de CBD para epilepsia?

A dose inicial e os ajustes são individualizados e devem ser definidos exclusivamente por um médico. Inicia-se com doses baixas e aumenta-se gradualmente, monitorando a resposta e os efeitos adversos.

Todos os produtos de CBD são iguais?

Não. A qualidade, concentração e pureza podem variar. É crucial usar produtos farmacêuticos ou aqueles com COA de laboratório independente e registro/autorização da Anvisa para segurança e eficácia.

O CBD tem efeitos psicoativos?

Não. Diferentemente do THC, o CBD não possui propriedades psicoativas e não causa euforia ou alteração da percepção.

Posso usar CBD se já tomo outros anticonvulsivantes?

Sim, frequentemente é usado como terapia adjuvante. Seu médico deve estar ciente de todos os medicamentos, pois o CBD pode interagir com eles, exigindo ajustes de dose e monitoramento.

Quanto tempo leva para o CBD começar a fazer efeito?

O tempo pode variar. Alguns pacientes notam melhoras em semanas, outros podem levar mais tempo para ajustar a dose e perceber uma redução nas crises. O acompanhamento médico é essencial.

Conclusão

O canabidiol representa um avanço significativo no tratamento de epilepsias raras e severas, como as síndromes de Dravet, Lennox-Gastaut e a Esclerose Tuberosa. Com evidências clínicas robustas e aprovações regulatórias, ele oferece uma opção terapêutica valiosa. No entanto, seu uso requer rigoroso acompanhamento médico, atenção à qualidade do produto, monitoramento de efeitos adversos e gestão de potenciais interações medicamentosas. O conhecimento aprofundado sobre o CBD capacita pacientes e cuidadores a tomar decisões informadas em conjunto com seus médicos, caminhando para um melhor controle das crises e uma qualidade de vida aprimorada.

Leituras recomendadas

  • Pilar: Segurança e Interações do CBD
  • Pilar: Regulação do CBD no Brasil
  • Guia: Como ler rótulos e laudos (COA)